quinta-feira, 2 de janeiro de 2014

Emboscada na Cameia

Emboscada na Cameia

7/09 1967.

Dia da Nossa Senhora do Castelo, padroeira de Mangualde, dia memorável fazia precisamente quatro anos que tinha embarcado no Navio Niassa com destino a Angola, nestas circunstâncias há sempre um motivo para festejar recorrendo ás cucas, no entanto a minha alegria era subjectiva e com pouca disposição para celebrar eventos, dado á larga e longa permanência por terras de África, deambulava pela parada, com o destino á cantina e, eis que o nosso Comandante me interpela, ordenando-me a ser integrado  num grupo de combate com a missão de visionar  uma sanzala na região da reserva nacional da Cameia, (reserva nacional de caça, embelezada pelo Lago Dilôlo) situada entre Lumeje e Teixeira de Sousa, esta a fazer fronteira com o Zaire e guarnecida pela outra companhia do nosso batalhão. Constava-se ali a proliferação do IN. Antes zonas sossegadas, consideradas zonas descanso, na altura territórios em disputa pela UNITA e MPLA, era suposto os batalhões fazerem metade da comissão em zona de guerra caso do norte e este batalhão levou com a região dos Dembos Zona Militar D. onde perderam bastantes efectivos, onde levaram muita porrada. Quando foram acantonados na Região Militar Leste, pensavam e muito bem irem fazer o resto da comissão em zona de descanso, saiu-lhes o tiro pela culatra, mereciam melhor sorte a sorte era o tal factor importante, mata ou morro eis a questão.

 Chegamos ao kimbo, avistavam-se fogueiras ainda em lume, vários animais domésticos, como: galinhas e cabritos, sinais que havia vida, as cubatas estavam desabitadas era costume ver-se Bikes, e a malta até se apoderavam de algumas...e máquinas de costura, era suposto que os habitantes estariam por próximo, ao aperceberem-se da nossa visita, abandonaram a sanzala, pois dado á grande planície era visível qualquer movimento á longa distância feito por o roncar dos motores dos Unimogs, e a poeirada levantada por seus rodados.

Não sei de onde partiu a ordem, de incendiar as cubatas, ou por ordens superiores ou por mera retaliação da malta, só me apercebi, quando já as chamas invadiam o aglomerado das habitações em palha e de fácil combustão foram rapidamente devoradas pela chamas. 

Por ter pouco conhecimento, do terreno e já com muito calo, preocupei-me em vigiar todo o circundante, até a arrancada do local., ordens para partir, espero que os companheiros subam e sou o ultimo a trepar, não me recordo quem comandava, recordo sim um Furriel porte alto franzino, mas muito simpático origem Indiana?!. mas com pouca comunicação, que me desculpe, parecia um pouco nervoso. Neste Grupo de Combate não havia na ocasião um Oficial Miliciano a comandá-lo como seria normal. (A Companhia tinha falta destes activos no quadro de Oficiais)

Seguíamos em coluna e após um km mais ou menos, numa ligeira curva caíamos numa emboscada e somos atacados com granadas e fogo em cima, lógico que conforme a deslocação é sempre a ultima  viatura a ser a mais atingida, num salto bem preparado, caio na orla da mata que não sendo muito cerrada, avistava-se, contudo a pouca distância os abrigos do IN, já ferido recuei para debaixo do Unimog, banhado pelo
combustível, que caía sem piedade ,sobre os militares e pelos tiros vindo da mata, rolei mais para a traseira , tendo sido ferido na cabeça, peito e nas mãos , e, já sem munições, pedi ao enfermeiro e grande amigo Cadete para me municiar o que devido á minha gravidade, me aconselhou a manter-me quieto o que desobedeci,  gritando venham cá seus filhos da puta, cabrões, estava quente e não sentia dor  sentia sim raiva, raiva sem saber porquê. pelo IN ?.sei lá! É uma reação natural do outro lado, de quem vê os seus bens a serem destruídos. Raiva pela situação de uma guerra injusta..! Era necessário a acção de umas bazukadas ou morteiradas, o Cardoso da Bazuka, recordo vê-lo encostado a uma arvore, ferido nas pernas e outros mais, com ais e ais…ainda gritei calem-se car..lh., ouviram-se umas morteiradas e a situação acalmou, fui de opinião que se mandassem umas morteiradas com o destino donde vinham os tiros, só assim é que o IN debandou, não havia  rádio nem comunicação, possível, restava a marcha até ao aquartelamento e com o factor sorte, todos ao molho, debaixo de um calor abrasador, chegamos ao Lumeje.
 
 
 
fotos trocadas
O nosso Comandante, ficou desolado com o que viu. Quis saber a situação dos feridos o seu estado, para lhe dar o respectivo encaminhamento, os de maior gravidade, se a memória não me atraiçoa, era o Zé Terras e o Louro, fomos reencaminhados para o Hospital do Luso, não quisemos Heli., fomos de comboio, no vagão da croeira, “mandioca” O comboio dos caminhos de ferro de Benguela fazia Benguela a Teixeira de Sousa. Na estação do Luso esperava-nos uma ambulância, que nos transportou ao hospital, perdi o contacto dos outros camaradas o Cardoso e Ramalhete, que já nos deixou, e outros que não recordo, foram vários os feridos nesta acção.

Já no hospital do Luso, diziam os camaradas que a minha cara parecia uma múmia, o pó o sangue em pasta, o inchaço, obviamente que o arrefecimento deu origem ás dores insuportáveis, eram as mãos, a cabeça e o peito, ali fizeram as primeiras extracções onde permaneci 30 dias, regressei ao aquartelamento sem alta médica.
 
               O Zé Manuel no Hospital do Luso a recuperar das mazelas sofridas em combate 

Após regressar ao quartel logo fui destacado para o Cassai.
Devido á escassez de efectivos, sou solicitado pelo nosso Comandante para engrossar uma secção destacada para o Cassai, com a missão de dar segurança ao chefe da estação, por haver rumores de possíveis ataques…e assim continuar a dar a minha colaboração activa à Compª de Cavª 1535.

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